quinta-feira, 6 de outubro de 2011

A verdadeira história do "Programa Escola Segura"

Já nos referimos aqui ao "Programa Escola Segura", a propósito de uma entrevista da "Gazeta das Caldas" a que, na semana passada, um ex-ministro da Administração Interna, Alberto Costa, entendeu responder com uma reivindicação: por outras palavras, disse, o "Programa Escola Segura" tinha sido criação sua.
Não foi, no entanto.
E sem sabermos se a "Gazeta das Caldas" resolve aplicar os princípios do bom jornalismo e aprofundar a questão, pusemo-nos nós à procura e podemos pormenorizar a informação que já publicámos.
Há quem tenha a memória curta por deficiência própria e quem a tenha curta porque lhe dá jeito. Nós não temos a memória curta.
Portanto, eis a história abreviada do "Programa Escola Segura":

1 - A decisão de criar um gabinete específico no Ministério da Educação para se ocupar em permanência dos problemas de segurança nas escolas (onde a PSP e a GNR não podiam intervir, salvo em situações de crime) foi tomada em 1986 quando era ministro da Educação Roberto Carneiro. O seu braço-direito, e secretário de Estado, Alarcão Tróni ficou com esse pelouro e nomeou para esse gabinete o então major Jorge Parracho, que tivera funções de comando da PSP em Macau. A lógica era esta: o ME passaria a dispor de um corpo de vigilantes, constituído por pessoal das forças militares policiais que não estivesse ao activo, para acompanhar de perto a situação das escolas de maior risco, agindo sempre em articulação com os professores. Os bons resultados obtidos afastaram os receios de sectores da esquerda de poderem ter "ex-militares" e "ex-polícias" a patrulhar as escolas.

2 - Em 1991, houve eleições (que deram origem ao último governo de Cavaco Silva) e Roberto Carneiro foi substituído por Diamantino Durão, um professor do Instituto Superior Técnico "soprado" a Cavaco Silva pelo seu sobrinho, Durão Barroso). Entre Outubro de 1991 e Março de 1992 reinou o caos no Ministério da Educação, com a equipa do professor do IST a soçobrar no vendaval da "guerra das propinas" e no seu próprio mar de disparates.

3 - Em Março de 1992, o actual deputado Couto dos Santos é nomeado ministro da Educação e a situação no sector demora algum tempo a estabilizar-se. Decisivamente apoiado pelo novo ministro, o gabinete de segurança manteve a sua actividade e alargou a sua acção junto das escolas. À sua frente manteve-se Jorge Parracho.

4 - O protocolo entre o ME e o Ministério da Administração Interna, que dá um apoio mais sólido à actividade do gabinete de segurança (respeitando sempre os limites de intervenção dos vários sectores em presença) foi assinado em 16 de Setembro de 1992.

5 - Em Dezembro de 1993, Manuela Ferreira Leite substituiu Couto dos Santos no Ministério da Educação, onde se manteve até às eleições de Outubro de 1995. O programa de segurança foi alargado e a autoridade do gabinete de segurança e o apoio prestado às escolas não sofreram contestação nenhuma.

6 - Em Outubro de 1995, o PS ganhou as eleições legislativas e formou governo. Para ministro da Educação avançou Marçal Grilo e para a Administração Interna Alberto Costa. Jorge Coelho foi nomeado ministro adjunto do novo primeiro-ministro António Guterres com o pelouro da propaganda.

7 - E coube, aliás, a Jorge Coelho (que substituiu Alberto Costa no MAI em 1997) o papel de impulsionador do "Programa Escola Segura". Marçal Grilo não estava muito interessado na tutela desse regime de segurança escolar, Alberto Costa estava desesperadamente necessitado de boa imprensa e de dar qualquer coisa à PSP que não o deixava em paz e Jorge Coelho viu no "Programa Escola Segura" (com os carros de baixa cilindrada e devidamente pintados) a possibilidade de fazer um brilharete e de pôr o governo a beneficiar da boa imagem do programa de segurança do ME.

8 - Mas sem Couto dos Santos e Manuela Ferreira Leite nunca o programa de segurança do ME teria sobrevivido.

9 - Hoje em dia, aparentemente, o "Programa Escola Segura" ter-se-á institucionalizado e, com isso, perdido alguma da capacidade de iniciativa de que dispunha quando estava apenas no ME. Mas não deixou de manter uma imagem positiva e não é de estranhar que haja quem o queira pôr ao peito. Quanto ao gabinete de segurança, continuou a ser dirigido até 2007 por Jorge Parracho, entretanto promovido a coronel.

Esta é a verdadeira história do "Programa Escola Segura".
Nenhum ministro, e muito menos de fora do ME, o pode reivindicar como seu. Aliás, se alguém o pode fazer é, justamente, o coronel Jorge Parracho, discreto e rigoroso e, há vinte e tal anos, o "cérebro" por detrás de uma ideia muito simples mas de alta eficácia.

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